25/04/2016 12:24:08
A Caixa Econômica Federal foi o ponto de partida para uma discussão mais ampla a respeito da função estratégica dos bancos públicos no “Seminário interno: conjuntura, sistema financeiro, bancos públicos e função dos trabalhadores”, realizado nesta quarta-feira (13) pelo Sindicato e pela Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito do Centro Norte (Fetec-CUT/CN).
Fernando Nogueira da Costa, professor titular de Economia na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e ex-vice-presidente da Caixa (2003-2007), tratou do tema a partir da interação do banco com outras empresas do sistema financeiro. Autor do livro 'Brasil dos Bancos' e 'Bancos públicos no Brasil' (em produção), ele fez, ainda, uma exposição técnica e didática sobre a concentração bancária regional por captação de riqueza financeira e o destino do crédito orientado pelas políticas públicas, incluídas as de renda e emprego, contrastando bancos privados e bancos públicos no Brasil, os privados de matriz estrangeira e comparando aspectos internacionais das finanças bancárias e sua repercussão na sociedade.
Nogueira ressaltou a importância dos bancos públicos no combate à desigualdade regional e mostrou que os números do financiamento imobiliário realizado pela Caixa cresceram exponencialmente no período de 2003 a 2014. Já no ano de 2015, a concessão de crédito imobiliário cai cerca de 30% diante, por exemplo, da menor demanda da classe média.
Segundo os dados, houve também aumento na quantidade de habitações financiadas desde o primeiro governo de FHC até hoje. Naquele governo, final da década de 1990, o financiamento habitacional não chegava a 700 mil unidades. No atual governo, o financiamento ultrapassa 3,2 milhões de unidades, com 2,6 milhões entregues, principalmente na faixa popular.
Sobre a oferta de crédito, o economista destacou que a demanda para pessoa física é superior em todas as regiões brasileiras, com exceção do sudeste, onde o crédito destinado para pessoa jurídica é maior, e mais concentrada a riqueza financeira. “Os bancos públicos compensam o que os bancos privados não fazem. Isso significa que a privatização irá ‘secar’ o crédito nas regiões mais pobres.”
O secretário de Bancos Públicos da Fetec-CUT/CN, André Nepomuceno
Para o secretário de Bancos Públicos da Fetec-CUT/CN, André Nepomuceno, que coordenou os trabalhos, o objetivo do encontro é aprofundar o conhecimento direcionado para o setor financeiro, com o olhar voltado para o desenvolvimento do país. “A intenção é que esta seja a primeira experiência de uma sequência de discussões que serão retransmitidas para a categoria e para toda a sociedade, para avançar no acúmulo sobre o papel dos bancos públicos federais e estaduais e sua importância para a sociedade”, explicou Nepomuceno.
“Esse é mais um espaço de formação interna com o propósito de trazer proposições para melhor qualificar a atuação sindical”, destacou o presidente do Sindicato, Eduardo Araújo.
Também participaram do seminário o presidente e o secretário de formação da Fetec-CUT/CN, José Avelino e Jacy Afonso, respectivamente, e o presidente da Fenae, Jair Pedro Ferreira.
Reestruturação não é a solução
A partir da análise do balanço de 2015, divulgado em março pela Caixa, Nogueira afirmou que o baixo rendimento, se comparado ao de 2014, não tem relação com as despesas com o corpo funcional da empresa e que, por isso, o processo de reestruturação em andamento não tem justificativa financeira.
“Foram a má gestão e erros de estratégia financeira que levaram a Caixa aos resultados obtidos no ano passado, com um pequeno aumento de 0,9% em relação a 2014. Se compararmos com os demais bancos, a Caixa tem despesas com pessoal com peso relativamente maior, porém, quando se avalia a relação entre despesas e receitas finais da empresa, de 44% e 35%, respectivamente, notamos o desequilíbrio e a razão do problema financeiro”, destacou o ex-vice-presidente, referindo-se a números específicos da Caixa.
Nogueira comentou ainda sobre o Projeto de Lei do Senado (PLS) 555, tramitando agora na Câmara como PL 4918, que propõe a abertura do capital das empresas estatais, entre outras medidas privatizantes. Ao contrário do que apregoam ideologicamente os defensores, o economista afirma que, com a aprovação do “Estatuto das Estatais”, haverá a possibilidade de abertura para nomeação de apadrinhados políticos, mesmo sob a alcunha de “independentes” ou “de mercado”.
Para Nogueira, “é um péssimo momento para se pensar em abrir o capital, ainda mais se considerarmos que houve aumento do risco de mercado e queda dos indicadores prudenciais”.
Fernando Nogueira da Costa, professor de Economia na Unicamp e ex-vice presidente da Caixa
O professor defende um critério de profissionalização como pré-requisito para gestores bancários de bancos públicos, e sugere uma estrutura conjunta de certificação mínima para postos gerenciais, articulada em comum, por exemplo, entre BB, Caixa, bancos estaduais e demais federais, BNDES e Banco Central. Algo no sentido de fortalecer o profissionalismo de uma carreira estratégica de estado.
Para o coordenador do encontro e secretário de Bancos Públicos da Fetec-CUT/CN, André Nepomuceno, o evento esclareceu muitos fundamentos do seu temário, e, quanto às reestruturações, “apresentou evidências numéricas de que, entre as despesas, a de pessoal não é a determinante. Nada justifica a reestruturação em curso na Caixa, na qual a despesa financeira inadequada é a que mais pesou; muito menos que seja feita de modo autoritário, seguindo cegamente consultorias caras, que não têm o olhar para a singularidade da empresa e aplicam modelitos de grife estrangeira. Aliás, esta infeliz opção, com aspectos semelhantes em reestruturações que ocorrem no Banco do Brasil e no BRB, demonstra que efetiva, sim, seria a escuta e discussão com os empregados e a ampla negociação com as entidades representativas”.
Os interessados em saber mais sobre o trabalho do professor Fernando Nogueira podem acessar o site fernandonogueiracosta.wordpress.com.
Rosane Alves e Joanna Alves
Do Seeb Brasília